quarta-feira, 14 de julho de 2010

Vacina contra mentira (Alexandre Pelegi)


“A boa fé nunca se contou entre o número das virtudes políticas porque ela tem na verdade pouco com que contribuir para essa mudança do mundo e das circunstâncias que são parte integrante das atividades políticas mais legitimas.” (Hanna Arendt, Verdade e política)

Políticos quase nunca fazem o que dizem. Na verdade, muitos não sabem o que falam; outros sequer sentem o que verbalizam, e muitos não acreditam na verdade como ferramenta fundamental do discurso...
Políticos sabem lidar com a mentira, e podem ser diferenciados pela naturalidade com que a aceitam como arma fundamental no jogo político. Isso não é novidade, tampouco é exclusividade de brasileiros ou subdesenvolvidos em geral. Mentir e ser político são fatos indissociáveis na história da humanidade.
Para aqueles que buscam uma nobreza funcional para a mentira, Maquiavel é um dos mais citados. Segundo ele, caberia ao governante o uso de meios excepcionais para alcançar os fins que almeja. Daí a frase “os fins justificam os meios”, jamais escrita por ele, acaba como sentença final do vale-tudo político. O que importa mostrar, na verdade, é que desde que o mundo é mundo a essência da política oscilou ora entre bondade e crueldade, ora entre verdade e falsidade. Maquiavel ensinava não a ser bom, mas sim a agir politicamente no mundo das aparências, onde nada conta senão o que se vê. E isso é política...
O pensador contemporâneo Max Weber via o exercício da política na diferença entre uma ética de resultados e uma ética baseada em princípios. Freud pôs o dedo na ferida: lobo e cordeiro sempre andam juntos, pois o inconsciente que carrega o desejo não conhece caminhos morais ou amorais que permitam sua realização sem contradição no pensamento e na ação.
Tudo isso para chegar ao óbvio ululante: políticos mentem, e o que deveria preocupar é o bem ou o mal que o ato político produz. Mentiras não são apenas palavras, mas principalmente atos. Como verdade e mentira, razão e poder têm objetivos distintos, e um depende do outro. A razão, em busca de conhecimento, interfere com o mundo e o acaba modificando. Já o poder modifica o mundo com a intenção de dominá-lo; para isso, se preciso for, modifica a própria razão...
Ao fim e ao cabo, nada melhor que tomarmos vacina contra a mentira de políticos. A boa notícia é que ela continua não só eficiente, como é a mesma após milênios: o conhecimento.

TEXTO COPIADO DE http://www.primeiroprograma.com.br/

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